O que precisa mudar no Flamengo nas relações com as torcidas organizadas

Passou da hora dos clubes assumirem sua responsabilidade.



Já escrevi aqui ontem que tenho candidato nesta eleição no Flamengo: é Eduardo Bandeira de Mello, da Chapa Azul. Até a votação, devo publicar por aqui alguns textos sobre o que eu acho que precisa mudar no Flamengo, em diversas áreas. É a minha visão, não necessariamente a da chapa, mas elas devem coincidir em boa parte - menos em alguns temas, mais em outros. No de hoje, sinceramente não sei.

Minha ideia era começar pelo que mais interessa a quem vem a este blog: o futebol. Mas, pelos acontecimentos do dia, vou deixar este texto para depois e tratar de um ponto mais específico. No caso, a relação com as torcidas organizadas.

Pra quem não sabe: a Polícia Civil prendeu oito integrantes da Torcida Jovem do Flamengo, depois de investigações iniciadas graças ao assassinato de um torcedor do Vasco em agosto do ano passado. As acusações não ficam apenas em episódios de violência, mas também passam por corrupção e fraude. Michel Levy, Vice-Presidente de Finanças do Flamengo, foi intimado a depor como testemunha, por razões que a Polícia não divulga - e não podemos ser levianos fazendo suposições a torto e a direito antes que a situação fique mais clara.

Com a repercussão do caso, a diretoria do Flamengo divulgou uma curta nota oficial, dizendo repudiar qualquer tipo de violência e afirmando que o clube não tem nenhuma relação com qualquer episódio causado por torcidas organizadas. Será mesmo?

A Polícia exibiu o que foi apreendido na sede da Torcida Jovem no Centro, que foi lacrada, e nas casas dos presos. Drogas, armas pesadas, dinheiro falso - e material esportivo oficial do Flamengo. Novo, embalado, ainda com etiqueta. Na foto publicada no GloboEsporte.com, vê-se uma camisa com a marca da Unicef. Algo que não se encontra por aí à venda nas lojas.

Sabe-se que vender material esportivo conseguido dentro do clube é uma fonte de renda para membros mais influentes das organizadas. Da mesma forma, estas organizações têm facilidades para conseguir ingressos, ganham apoio para viagens. Mas ninguém tem interesse em deixar claro como tudo funciona, preferindo deixar esta relação em névoas; nada é institucional e transparente, tudo ganha jeitão de troca pessoal de favores. E alguns destes torcedores chegam a ganhar cargos e empregos relacionados ao clube. Os atos de violência se sucedem, os líderes repetem que "não têm como controlar todo mundo" e a diretoria não muda sua relação com as facções. E aí vem uma nota oficial dizendo que o clube não tem nada a ver com isso.

Já há algum tempo escrevi aqui que a loja online oficial do clube tem uma seção específica só de produtos da facção. Falei na época de um boné sobre a "União Sinistra" com a Independente, do São Paulo. Hoje, há também por lá um produto com o singelo título "Regata Jovem Porrada Neles". Se você não quer uma regata, pode escolher uma camiseta, inclusive com diferentes opções de cor. A mensagem é clara. E o Flamengo, que diz repudiar qualquer tipo de violência, permite que quem transmite este recado ganhe dinheiro com ele, vendendo produtos associados à sua marca em sua loja oficial.


* * * * * * * * * *

Não é todo integrante de torcida organizada que é marginal. Muitos são simplesmente torcedores abnegados, que vão a todos os jogos, que produzem bandeiras e faixas, chegam mais cedo para montar mosaico, gastam dinheiro para ir atrás do time em lugares distantes e inóspitos. A festa que produzem gera imagens bonitas e contribui para valorizar a marca do Flamengo. São alguns dos clientes mais fiéis e importantes que o clube tem, e merecem ser valorizados por isso. Mas é preciso separar o joio do trigo. O que não é fácil e exige coragem, pois estamos falando de bandidos mesmo.

O primeiro passo é institucionalizar a relação. Sei que há gente bem mais radical que eu, mas não sou contra descontos em ingressos e apoio a viagens para quem quer apoiar o time e se dispõe a se doar mais do que os outros; não sou contra poderem vender camisas e bonés da torcida para levantar recursos para a festa que produzem. Mas todo mundo tem que saber como o Flamengo lida com suas torcidas organizadas, quem é o responsável por isso lá dentro, quais são as regras. A facção que quiser se relacionar com o clube deve se cadastrar, cumprir requisitos de frequência no estádio e, óbvio, bom comportamento. O clube deve identificar e ter controle sobre quem está tendo acesso a qualquer vantagem. Quem não cumprir o acordo, está fora. Ficam as torcidas, saem as gangues.

Assim como o bandeirão, o mosaico e o papel picado fazem parte da festa e engrandecem o Flamengo, manchetes como as de hoje também afetam a instituição. E não é uma nota oficial com meia dúzia de linhas tirando o corpo fora que vai mudar isso. Este é um problema de polícia sim, e torço para que ela passe a fazer melhor seu trabalho, inclusive indo atrás de quem acoberta criminosos. Mas já passou da hora dos clubes - não só o Flamengo - assumirem sua responsabilidade.

4 comentários:

Ricardo Barcellos disse...

Oportuno o assunto e, como sempre, muito bem abordado, André. No mar de lama em que se encontra o nosso Flamengo, ler sua coluna me traz um pouco de alento. Esse clube ainda será decente. Um dia...
E seria realmente muito bom ouvir as opiniões dos candidatos à presidência sobre esse assunto nebuloso. É inadmissível que um bandido (ou falastrão) como o indivíduo que se intitula "Peruano" ameaçar alguém de morte e nada ser feito a respeito. Por menos do que isso, eu já vi gente tendo que se explicar na justiça ou na polícia. E, no entanto, aparentemente nada foi feito. Isso, para mim, demonstra claramente a que ponto (baixíssimo) chegamos... Abraço do seu leitor assíduo.

Raphael Perret disse...

Tiraram a regata "Porrada neles", o link diz que a busca não retornou resultados. Interessante, não?

André Monnerat disse...

Depois do "furo" do SobreFlamengo, saiu no GloboEsporte.com. Aí deve ter chamado a atenção, presumo...

saulo disse...

Eu sou bem radical enquanto a isso. Essas torcidas, principalmente essa Jovem aí, vive de cantar pra si própria, pras suas uniões e incitar a violência. Chegou ao ridículo dos mesmos não comemorarem gol do Flamengo contra o SPFC. Quantas e quantas vezes indo ao Engenhão, passei na frente do setor sul e vi "torcedores" da Jovem, de casaco da torcida, vendendo ingressos a preço de meia? Já ouvi dizer que os seguranças da Gávea foram contratados por indicação dessa facção e por isso a facilidade de penetração que esses caras têm. Já ouvi que esse Cap. Léo e um tal de Bodão, que vive de Flamengo, são ex-integrantes que se infiltraram no quadro de sócios e volta e meia ameaçam sócios e frequentadores da gávea pra conseguir o que querem. Aí o PRESIDENTE da torcida é preso com arma. Dinheiro falso na sede. Histórico de mortes e confusão. Sinceramente, pra mim é caso de extinção dessa porcaria de torcida que só envergonha os verdadeiros torcedores.
Será que é tão difícil resolver isso? cadastra os torcedores organizados e, caso esses se envolvam em tumulto, a própria torcida tem que apresentá-los as autoridades. Caso os delinquentes não sejam identificados, a torcida recebe sansões gradativamente mais pesadas, até chegar ao caso do fechamento. O mesmo se for comprovado que a ação não foi isolada e sim orquestrada. Quanto a desconto e ajuda do clube sou radicalmente contra. Só serve pra ajudar quem não faz nada da vida a continuar um improdutivo que vive do clube. Como dizem por aí cabeça vazia, oficina do diabo. Quer acompanhar o Flamengo? Trabalha muito, ganha dinheiro e depois pensa em futebol...