O que precisa mudar no Flamengo na administração de seu dinheiro

O mercado está ajudando e é possível fazer o Flamengo honrar seus compromissos, acertar sua vida e voltar a ter credibilidade. Mas é preciso uma grande transformação para isso.



Como sócio votante que sou, recebi um material impresso muito bem feito da campanha de Patrícia Amorim para presidente do Flamengo. Nele, além da exaltação dos avanços que conseguiu no patrimônio do clube, há partes em que forçam a barra para dizer que até mesmo a situação do futebol melhorou - mas ok, faz parte. Tudo sob o seguinte mote: "Nos primeiros 3 anos, arrumamos a casa. Agora o Flamengo pode continuar crescendo".

A ideia neste texto é falar das finanças do Flamengo. Segundo a campanha de Patrícia, "arrumaram a casa" nesta área e agora o clube poderá seguir um futuro mais tranquilo. Bem, antes de mais nada, peço para que vocês vão a este link, para ler sobre o depoimento do contador contratado pelo clube para assinar seu balanço, e me digam se parece que a casa está arrumada. Estas são algumas declarações de Rogério Tosca da Encarnação, homem que lidou no seu dia-a-dia profissional com esta casa arrumada, falando aos conselheiros do Flamengo:

 As diretorias são formadas de maneira indigna. Basta ser meu amigo que eu vou conservá-lo aqui dentro para fazer uma série de coisas.

Eu sou colocado de costas e tenho de pedir desculpas a alguém que passa a mão na minha bunda, pedir desculpas por estar de costas.

Quero exercer a minha função e não posso fazê-lo. Presto contas de 114 empresas. Aqui só tem um problema: muito cacique e pouco índio. É o que está aqui.

Eu sou remunerado para trabalhar aqui. Lamentavelmente, me perdoem todos que estão me ouvindo aqui, é muito fácil você ver na diretoria ou quem tem a responsabilidade de responder pelo Flamengo bater no peito e dizer: 'Não ganho um tostão para estar aqui'. Não está certo isso. Deveria ser remunerado para saber o peso de uma responsabilidade. Essa gratuidade vira leviandade.

As diretorias não se mobilizam e não se qualificam para tal. Esta é a situação. Não é uma denúncia, é uma colocação. Eu me sinto capaz de responder a qualquer um de vocês. Mas nessa colcha de retalhos que vivemos aqui, eu me sinto incapaz de fazê-lo. Isso não é certo. 
O depoimento expõe uma realidade óbvia: o Flamengo não tem - e isso não é novidade desta gestão, vale ressaltar - o mínimo de organização para lidar com seu dinheiro. Não tem padrão de processos, de registro, de controle. Não tem um Departamento Financeiro de verdade, estruturado, profissional. Com isso, ninguém sabe direito quanto entra, quanto sai e por que sai; ninguém sabe com o que pode ou não contar para tocar a vida do clube. Os departamentos não têm claro quanto podem ou não gastar, o fluxo de caixa é descontrolado e assim lemos todos os dias na imprensa que o Flamengo não consegue pagar suas contas; fecham, por exemplo um negócio com o Avaí já no final do ano e apenas um mês depois já descobre que na verdade não pode pagar o que acordaram.

Até a reunião em que Rogério da Encarnação falou, em agosto, nenhum balancete havia sido produzido em 2012 - não sei se algum chegou a ser desde então. E todo ano os auditores contratados para analisar as contas do clube deixam registrado que não podem afirmar que aqueles números são reais, simplesmente por falta de documentos e de respostas dos órgãos do clube.

Casa arrumada?

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O Flamengo tem uma grande dívida. Embora a diretoria diga que pagou mais de R$100 milhões em dívidas das gestões anteriores (deve ter pago - mas para isso, teve que criar novas dívidas), o passivo do Flamengo cresceu de R$344,6 milhões em 2009 para R$830,1 milhões em 2011 (crescimento de 140%). O passivo circulante - obrigações passadas que devem ser pagas em até 12 meses - saltou de R$151 milhões em 2009 para R$342 milhões em 2011 (crescimento de 126%). Em 2009, eram R$34 millhões e dívidas de impostos e contribuições sociais; em 2011, eram R$74,7 milhões (crescimento de 119%).

Enquanto isso, a receita anual do clube passou de R$120 milhões para R$184 milhões - crescimento de 53%. Em 2009, o clube tinha R$1,25 de passivo de curto prazo para cada R$1 de receita; em 2011, passou para R$1,86. Quando falam que o patrimônio do clube saiu do negativo, não contam que isso só aconteceu porque reavaliaram bens imóveis em mais de R$200 milhões, num procedimento bastante discutível pelas normas de contabilidade.

Mas é possível lidar com esta dívida. O mercado ajudou e o Flamengo tem garantidas grandes receitas ao menos nos contratos de material esportivo e de TV, o que cria condições para poder se acertar, inclusive mantendo equipes competitivas - a diferença nestes tipos de receitas em relação a clubes como Cruzeiro, Grêmio, Inter, Atlético-MG, Botafogo e outros é hoje gigantesca. O principal para o clube viver bem é organizar seu fluxo de caixa; conseguir negociar a dívida, parcelar, alongar seu perfil e assim saber quanto vai precisar pagar dela a cada mês, sem ter que conviver com penhoras "inesperadas" que travem a entrada de dinheiro. Com isso, é possível organizar seu orçamento, prevendo quanto realmente vai entrar, quanto realmente vai sair, e definir com quanto cada área do clube pode contar. Lógico que tudo isso só pode ser feito realmente estruturando seu departamento financeiro, contratando profissionais, definindo processos e controles, tudo o que o clube hoje não tem.

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Uma iniciativa interessante de um clube que passou também por situação desesperadora de fluxo de caixa e pode servir de exemplo é o Condomínio de Credores criado pelo Grêmio em 2005, idealizado pelo advogado Celso Rodrigues. Foram chamados diversos credores - jogadores, treinadores, investidores - que cobravam na Justiça dívidas de, no total, cerca de R$50 milhões. No acordo, fizeram com que um percentual de certas receitas, em especial de venda de jogadores, fosse direcionado automaticamente ao pagamento da dívida. O valor era dividido entre o grupo que aceitou fazer parte do trato, topando um prazo mais longo em troca da certeza de receber. O mecanismo fez com que as ações na Justiça fossem retiradas, evitando penhoras e deixando a vida financeira do clube mais previsível. Depois de 7 anos, a dívida com o condomínio foi encerrada este ano.


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Vale assistir à conversa com Claudio Pracownik, indicado pela Chapa Azul como futuro Vice-Presidente de Administração e TI, na TozzaCam - programa online comandado por André Tozzini e promovido pelo blog FlamengoNet. Profissional de sucesso, já com alguma experiência de Flamengo para conhecer como (não) funciona lá dentro e tendo participado da reestruturação de dezenas de empresas, ele fala com propriedade do assunto. E o indicado para liderar o comitê financeiro do clube, com a responsabilidade de reestruturar sua dívida, pela Chapa Azul é Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central. São pessoas como eles que, se os sócios permitirem na eleição de 3 de dezembro, definirão a estratégia e contratarão os bons profissionais de mercado que a colocarão em prática. Assim dá pra acreditar mais que será possível realmente colocar a casa em ordem, pronta para o Flamengo crescer.


2 comentários:

Marcelo Matteussi disse...

Sinceramente, é completamente absurdo que ainda pairem dúvidas quanto a quem deve ser eleito no dia 03/12. É a mesma coisa que comparar um profissional com pós-doutorado em alguma área do conhecimento com um sujeito malandro que leva o curso de graduação nas coxas e mal e mal consegue o diploma. Estamos falando de um abismo manifesto e inequívoco, o que me leva à conclusão de que as pessoas que apoiam a candidatura dessa gestão, sem dúvida uma das piores, senão a pior gestão de TODOS OS TEMPOS no Flamengo, só pode estar almejando alguma vantagem pessoal prometida, em óbvio detrimento ao nosso Flamengo.

Também me deixa perplexo a postura do restante da oposição, que ao invés de apoiar a chance de ouro que temos com a candidatura da chapa azul, prefere fazer o joguinho da gestão atual e dividir os votos de quem não está contente com o momento institucional e político do Flamengo. É uma vergonha.

Rezo todos os dias para São Judas Tadeu: o Flamengo NÃO PODE perder a oportunidade de contar com as pessoas à frente da Chapa Azul para se restruturar. É algo que pode não se repetir. E pior: entregar mais três anos para essa gestão desgraçada, que fará o Flamengo despencar em todos os quesitos, não só em termos de patrocínio, onde vergonhosamente, hoje, não ocupamos nem mesmo as 5 primeiras posições.

São Judas Tadeu, nos ajude!!

Luis disse...

O que precisa mudar? As pessoas!

Uma entidade com a quantidade de seguidores, simpatizantes etc da marca que temos (quase 39 milhões) e contratos multi milionários deve ter gente adequada administrando - em todos os níveis.