Que os conselheiros votem o contrato do Morro da Viúva pensando apenas no Flamengo

É hoje a reunião do Conselho Deliberativo para votar o acordo com Eike Batista que transformará o prédio do Flamengo em hotel. Não é hora de questões políticas influenciarem na decisão.



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Hoje tem reunião do Conselho Deliberativo do Flamengo. A motivação principal é votar o contrato de concessão do Edifício Hilton Santos a Eike Batista, através da REX e da EBX Participações. É um prédio que o clube possui há décadas no bairro do Flamengo, com localização e vista privilegiados, avaliado no balanço do clube do ano passado em mais de R$60 milhões. Com a valorização que os imóveis do Rio de Janeiro tiveram nos últimos anos, em especial da Zona Sul, eu diria - sem ser especialista neste mercado - que em condições normais daria pra jogar este valor bem pra cima.

Porém, a manutenção do prédio é lastimável e levou-o a um estado muito ruim. Uma grande parte dos apartamentos está hoje desocupada e pessimamente conservada. Ao longo dos anos, o clube costumou permitir que atletas (até do futebol) morassem por lá, e ainda deve ter gente nesta situação. Há, inclusive, um processo de usucapião  relativo a um dos apartamentos. Pra completar, hoje ele carrega consigo uma enorme dívida de IPTU, parece que de R$16 milhões. É um patrimônio valioso que o Flamengo tem, que poderia gerar dinheiro, mas que há muito tempo dá prejuízo.

Já houve antes especulações sobre grupos interessados em assumir o Morro da Viúva para fazer dinheiro por lá. Em 2006, por exemplo, Márcio Braga apareceu falando em algo assim envolvendo o empresário israelense Pini Zahavi. Porém, só no ano passado Patrícia Amorim conseguiu na Câmara dos Vereadores a mudança de uso do terreno, permitindo a transformação do edifício residencial em um hotel. E aí as negociações com Eike Batista ganharam força.

A ideia do bilionário é transformar o Morro da Viúva em um hotel 4 estrelas. Pelas informações que tive, lendo notícias e alguns e-mails que circularam sobre o assunto, o Flamengo teria o perdão da dívida de IPTU e receberia ainda uma grana considerável - coisa de R$15 milhões. Eike se responsabilizaria pelas obras no prédio e teria o direito de explorá-lo por 25 anos, renováveis por mais 25. Ao longo deste tempo, o Flamengo receberia um aluguel de R$270 mil reais por mês (ou uma pequena percentagem do lucro do hotel - o que for maior) e teria o direito de usar alguns quartos para concentração do time de futebol.

Sem ser especialista em valores deste mercado, a proposta parece muito boa. O Flamengo para de ter prejuízo com o imóvel - ao contrário, passa a receber algo por ele -, recebe um bom dinheiro na mão agora e tem um patrimônio que hoje está em péssimo estado totalmente recuperado. Se o Flamengo tem dificuldades hoje em dia para administrar o que deveria ser seu negócio - um clube social e equipes esportivas -, que dirá um imóvel como este. Não é a vocação do clube e, até hoje, nunca deu certo.

Porém, é claro que um negócio como este não é simples. Cláusulas, valores, índices de reajuste, tudo precisa ser analisado. E no Flamengo, no fim, quem resolve este tipo de coisa é o Conselho Deliberativo, formado principalmente por Sócios Proprietários que, para estarem lá, basicamente precisaram apenas comprar o título. Como eu, aliás, que apenas não tenho ainda tempo de associação suficiente para estar lá.

Para que os conselheiros possam tomar a melhor decisão sobre este tipo de coisa, o ideal é que tivessem acesso transparente a todas as informações e aos argumentos da diretoria com alguma antecedência. Mas não é bem isso que costuma acontecer, e aí abre-se espaço para todo tipo de especulação. Há bastante gente fazendo campanha contra a aprovação do contrato, com muitos e-mails circulando que tratam o acordo como uma "armadilha". Os argumentos incluem contestações sobre detalhes do contrato (em especial as condições para tirar de lá os inquilinos que hoje ocupam apartamentos no prédio), índices de reajuste que deveriam ser aplicados para o valor real do que o Flamengo recebe não diminuir ao longo dos anos e contas comparando este negócio com quanto o clube receberia alugando os apartamentos todos. Recebi por cópia até mesmo um e-mail com um texto do neto de Hilton Santos - o presidente que dá nome ao prédio, responsável por consegui-lo para o clube -, contrário ao negócio. Neste texto, ele afirma que o terreno do prédio está cedido ao Flamengo pela Marinha com a condição de ser utilizado apenas para sede social e prédio residencial - trava semelhante à que existe no termo de cessão da Gávea ao Flamengo e que impediu a construção de um shopping center por lá.

É comum, na verdade, que muitos e-mails detonando qualquer contrato que vá ao Conselho Deliberativo circulem antes das votações. Isso não costuma impedir que as diretorias normalmente consigam por lá a aprovação do que querem. Porém, com questões envolvendo o patrimônio físico do clube, como o terreno da Gávea e o Morro da Viúva, os Conselheiros tendem a ser especialmente zelosos. Qualquer ideia de venda ou cessão destes patrimônios normalmente enfrenta muita resistência. E é aí que mora o perigo, cujo tamanho eu não consigo avaliar, deste negócio naufragar.

O que eu li das pessoas em que mais confio para avaliar este tipo de coisa é que o negócio é bom para o Flamengo. E Alexandre Wrobel, Vice-Presidente de Patrimônio que vem tocando esta negociação e também as obras do CT, é um cara que não conheço pessoalmente, mas do qual só ouço referências positivas, inclusive de gente muito contrária à administração Patrícia Amorim. Enfim: sem ler o contrato, sem ser um especialista neste tipo de negócio, realmente me parece que o Flamengo tem na mão uma grande chance de resolver um problema que se arrasta há muito tempo. Espero que os conselheiros que estarão lá hoje à noite tenham tranquilidade pra analisar bem a situação e votem pensando apenas no bem do Flamengo, deixando de lado questões pessoais e políticas.

3 comentários:

Marcelo Constantino disse...

O Estado vai perdoar a dívida ou o Eike vai pagar?

é o fim da picada o Estado perdoar -- ainda que seja lamentavelmente comum no Brasil.

André Monnerat disse...

Marcelo, pelo que entendi o Estado vai perdoar. É parte de um "pacote olímpico" para estimular obras deste tipo na cidade para as Olimpíadas.

Cleber Soares disse...

André,
agorinha mesmo(21h) tinha feito um texto lá no blog falando de forma simples e resumida as dificuldades e a zona que é comandar e comando do Flamengo acabo me deparando com a notícia que a cartolagem conseguiu fazer acertar uma negociação que de qualquer perspectiva só traz lucro ao clube... e olha que para isso demorou mais de 2 anos??!!
Mas o acerto é inegávelmente benéfico ao clube. fica a esperança que esse dinheiro seja realmente usado só para o bem do Flamengo.

BLOG DO CLEBER SOARES
www.clebersoares.blogspot.com