O Flamengo que eu gostaria de ver

Campeão, claro. E o que mais?


Na semana passada, no mesmo dia em que houve aquele memorável Santos x Flamengo na Vila Belmiro, vimos bombar no Twitter a campanha #foraRicardoTeixeira. Estimulada pela tão falada matéria com o presidente da CBF publicada pela revista Piauí e encampada por alguns jornalistas de perfil mais contestador, ela fez muita gente mesmo passar o dia protestando contra o cartola digitando frases de até 140 caracteres. O tema acabou dominando a lista dos trending topics - os assuntos mais falados no Twitter - daquele dia.

Sem fazer nenhuma pesquisa, aposto ainda que uma parte considerável dos que me leem aqui não têm simpatia por Ricardo Teixeira e que alguns deles até andaram tuitando o #foraRicardoTeixeira. Mas ele não é como uma daquelas tartarugas encontradas no alto das árvores: a gente sabe bem quem o colocou lá e não tem muita certeza de que ele vá cair, pois quem poderia derrubá-lo não parece ter nenhuma intenção de fazê-lo. E aí, sem intenção de criticar torcedor nenhum, só como provocação para que as pessoas pensem um pouquinho no assunto, vou fazer algumas perguntas aos meus leitores rubro-negros que não aprovam a maneira como o presidente da CBF usa seu poder e gostariam de vê-lo longe do comando do futebol brasileiro.

Sem entrar na questão do status atual desta briga desgracenta na Justiça, o que você sentiu quando leu a notícia de que a CBF havia finalmente decidido reconhecer o título brasileiro do Flamengo de 1987? Você simplesmente ficou feliz e deu parabéns enstusiasmados a Patrícia Amorim pela grande conquista ou sentiu algum incômodo por saber que aquilo estava acontecendo simplesmente porque, por trás da cortina, a diretoria do Flamengo entrou em acordo político com este mesmo Ricardo Teixeira e participou de decisões que favoreceram seu poder e o de seus aliados?
E, na sequência desta disputa cansativa com o Sport Recife, quando esclarecem que a ida dos pernambucanos à FIFA nunca poderia dar em nada porque a CBF só acompanhou dirigentes do Flamengo até lá - você apenas se sente satisfeito com o poder político de seu clube, que está fazendo o que é preciso pra garantir a justa posse da Taça das Bolinhas, ou se pergunta o porquê de Ricardo Teixeira de repente ter resolvido ficar tão do lado assim do Flamengo nesta questão?

Quando Ricardo Teixeira usa seu poder a favor de seu clube por motivos que talvez ele não queira dizer diante dos microfones, você acha que cabe tuitar um #foraRicardoTeixeira, ou é melhor não pensar muito nisso? E que postura a diretoria de seu clube deveria ter em relação ao presidente da CBF - e até a outras questões maiores?


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Gosto muito de cantar na arquibancada que sou "acima de tudo rubro-negro". Mas devo confessar: no meu caso, isso não é exatamente verdade.

Antes de ser rubro-negro, sou cidadão. Quero ver o Flamengo ganhando tudo dentro de campo, claro. Mas gostaria de ver a importância histórica e cultural que o Flamengo tem no Brasil, todo o seu peso para o país, sendo usado para melhorar a sociedade em que vivemos. O Flamengo pode exercer sua influência para o bem, dentro do futebol e indo até além disso, através de ações concretas e pela força do exemplo.

Gostaria de ver um Flamengo que não acredita que os fins justificam os meios. Que não faz acordos políticos favorecendo interesses menos nobres de terceiros, justificando-os com algum benefício próprio.

Gostaria de ver um Flamengo que, como todo cidadão deve fazer, paga seus impostos. Que não luta por isenções indevidas ou por perdões de dívidas contraídas simplesmente porque, em qualquer época, diretores preferiram gastar o dinheiro do clube em qualquer outra coisa. E que não pense em usar dinheiro público em seu benefício sem que ele realmente vá se transformar em algo que se pague para a sociedade.

Gostaria de ver um Flamengo que ame o futebol e perceba que o esporte como um todo - o que inclui clubes grandes e pequenos, de diversas divisões, em todo o país - é uma atividade econômica relevante para o país, que gera riqueza e trabalho e tem uma enorme função social e cultural. E que, por isso, aja não apenas visando puramente seu próprio interesse.

Gostaria de ver um Flamengo que respeite sempre seus rivais como grandes instituições que são, e que seja líder em uma nova maneira dos clubes se relacionarem.

Gostaria de ver um Flamengo responsável e transparente, como gostaríamos que todas as instituições de interesse público fossem. Que adote as melhores práticas de governança. Que publique seu balanço e demonstrações financeiras sem medo de que todo mundo veja, com as informações apresentadas de forma transparente aos seus sócios e à sociedade. Que também publique inclusive o seu balanço social.

Gostaria de ver um Flamengo democrático. Que, em vez de se manter nas mãos sempre dos mesmos poucos, crie mecanismos que favoreçam a participação e colaboração. E que sirva de inspiração para que esta mesma transformação aconteça em tantas outras instituições, em outras áreas.

Gostaria de ver um Flamengo líder no uso do esporte para a educação. Que tome a iniciativa de incentivar políticas públicas esportivas não com objetivo de conquistar medalhas olímpicas ou coisa do tipo, mas sim com metas de saúde, ensino e inclusão social que não se limitem àqueles que consigam efetivamente virar atletas de sucesso.

Gostaria de ver um Flamengo que inspire seus torcedores e aqueles que o admiram a seguirem valores de que possamos nos orgulhar. Que exija que estes valores sejam defendidos por aqueles que o representem, dentro ou fora de campo. Que trabalhe para formar não só grandes jogadores, mas grandes pessoas.

E gostaria de ver um Flamengo campeão. Porque, quando se é campeão, é bem mais fácil ser usado de exemplo. E porque, claro, sou Flamengo.

10 comentários:

Luiz Filho disse...

Perfeito!
Sua candidatura está lançada!
Se precisar do meu apoio terá!
Boa noite, Presidente!

Bosco Ferreira disse...

Como sempre, muito lúcido o André.
..........................
BELA NOTÍCIA:
Fair Play Financeiro da UEFA mudará futebol mundial a partir de 2014.

As novas regras mudarão a cara do futebol mundial.
Como a Europa controla o mercado do futebol no planeta, as contratações diminuirão drasticamente, além de uma desvalorização dos atletas.
Na América do Sul, por exemplo, Santos ou São Paulo não poderá deixar de recusar propostas em torno de 10 ou 15 milhões de euros para as estrelas Neymar e Lucas. No entanto, se quiserem, poderão manter as estrelas já que diminuirá a concorrência extrangeira. Sem dúvida uma Bela notícia.
http://www.opovo.com.br/app/colunas/football/2011/08/02/noticiafootball,2274396/fair-play-financeiro-da-uefa-mudara-futebol-mundial.shtml

Fernando Almenara disse...

Ótimo texto.... De qualquer forma, #foraRicardoTeixeira.

Fabricio C. Boppré disse...

É isso aí. Pena que nós -- os que pensamos assim -- somos uma minúscula maioria.

Fabricio C. Boppré disse...

Ops, desculpe, eu quis dizer "minúscula minoria".

Unknown disse...

Puts...como que alguém que é honesto e possui boa educação e bons princípios pode criticar uma coluna destas. Não tem como. Posso apenas colocar uma reflexão.

Esta é uma questão que no seu cerne remete a nossa cultura e as nossas ações como pessoas e cidadãos como você mesmo citou.

No fundo tudo se resume a cada pessoa fazer a sua parte para termos um mundo melhor. Por isso coloco um questionamento que se desdobra em muitos outros: NÓS ESTAMOS DISPOSTOS A FAZER A NOSSA PARTE?

Estamos dispostos a separar o lixo "seco" e o lixo "úmido", TODOS os dias?

Estamos dispostos a deixar nossos carros em casa e caminhar e usar bicicletas o máximo possível?

Estamos dispostos a abrir mão de vantagens profissionais e financeiras para seguir SEMPRE o caminho certo e respeitanto TODAS as regras?

Quem de nós respeita em 100% das vezes a lei seca, por exemplo?

Quem de nós usa o seu direito a voto e exerce o seu direito de cidadão para cobrar uma melhor administração e mais honestidade dos nossos políticos?

Ninguém precisa responder a estas questões, as respostas são óbvias e todos diriam "não...eu cumpro com a minha parte". Mas...com sinceridade...será que nós mesmos fazemos a nossa parte?

Eu não faço. Admito a minha parcela de responsabilidade, mas não acredito mais em Coelhinho da Páscoa e Papai Noel embora saiba que estou errado em não lutar contra o sistema.

Bosco Ferreira disse...

"Gostaria de ver um Flamengo que respeite sempre seus rivais como grandes instituições que são, e que seja líder em uma nova maneira dos clubes se relacionarem."

Será que o Arthur Mulhemberg leu esse poste.

André Monnerat disse...

Bosco, acho que os textos do Muhlemberg são outra parada, não era bem disso que eu tava falando. O que ele representa ali é a zoação do torcedor. Isso sempre vai existir, é bom que exista (dentro de uma civilidade, lógico). Falo de esportividade e respeito entre as instituições mesmo.

André Luiz de Ávila disse...

Excelente texto, Monnerat!
Não tenho nem como parabenizá-lo pelo que escreveu!
Está perfeito!
Abs!

Anônimo disse...

Parabens aos dois "andres". O comentário do andre foi muito bom também.