Não, eu não me emocionei com a despedida de Ronaldo

O Fenômeno jogou muita bola e merece as homenagens. Mas eu não estava num clima muito Galvão Bueno.


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Ronaldo nunca foi meu ídolo. Foi um dos maiores jogadores que vi jogar, foi eleito o melhor jogador do Mundo mais de uma vez, fez duas belas Copas e ganhou uma delas, tornou-se o maior artilheiro da história da competição e protagonizou uma das histórias de recuperação mais impressionantes de que já ouvi falar. Como jogador, foi uma trajetória admirável. Merece homenagens.

Mas não foi meu ídolo. A gente não escolhe nossos ídolos por critérios técnicos - é uma relação que se constrói. Um grande amigo meu, por exemplo, diz que um de seus maiores ídolos rubro-negros (talvez o maior) foi Fábio Luciano. E ele mesmo afirma que já viu jogadores melhores no clube, até zagueiros melhores.

Ronaldo saiu cedo do Brasil, depois de ter jogado pouco tempo no Cruzeiro. Daí construiu sua fama na Europa - e eu não acompanho de perto o futebol europeu, onde ele jogou quase toda sua carreira, longe de mim. Mas ganhou títulos pela Seleção, inclusive uma Copa do Mundo em que foi protagonista.

Só que, sinceramente, minha relação com a Seleção não é das mais fortes. Não é que eu "não ligue" completamente; até comento com os amigos as convocações e jogos, em época de Copa aquilo ganha mais importância, mas... No geral, são muitos jogadores que eu não acompanho, não vejo jogar com frequência, não conheço direito, muitas vezes estão até na reserva de seus times e eu nem sei o porquê. Ontem soube que o Elias é reserva do Atlético de Madri. O Jádson joga onde mesmo? Está bem por lá? Eu não tenho ideia. E acho até que eles não ligam tanto para o que a gente aqui sabe ou pensa deles.

É um time que normalmente joga em estádios distantes - é um tal de Brasil x Argentina em Londres, em Dubai... E quando vem pra cá, parece uma festa fechada para convidados, reforçando a impressão de que o time que já foi um símbolo nacional transformou-se em mero instrumento econômico e político nas mãos de muito poucos. Sempre tem camarotes com celebridades e políticos, esquemas pra proteger estes VIPS... E ingressos caros, muito caros. Daí já andamos vendo estádios com espaço sobrando mesmo em jogos oficiais, como aconteceu nas eliminatórias da última Copa. Ou gente indo embora faltando até 20 minutos para o jogo acabar, como se viu ontem.

Enfim, não sei se falo por mais gente. Mas, por mais que eu ache bacana o que Ronaldo construiu na Seleção e a enorme vontade que ele sempre demonstrou de estar lá (uma característica que ele teve em comum com Romário e que hoje vai parecendo cada vez mais rara), isso não foi o bastante para que eu tenha uma conexão com o cara. Talvez isso tenha a ver com essa relação que eu fui passando a ter, ao longo dos anos, com a Seleção.

Mas também não ajuda para isso a relação estranha que ele mantém com os setores mais influentes da mídia, que forçam uma enorme barra pra criar a imagem de "exemplo fora de campo", construindo um personagem que não existe e empurrando pra debaixo do tapete diversas passagens meio esquisitas de sua carreira. Parece que ontem o Casagrande até chorou na transmissão. Então tá, né?

Mas enfim: jogou muita bola.


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Em 15 minutos com Ronaldo em campo, o Brasil produziu mais do que em todo o resto do jogo. É óbvio que isso não aconteceu simplesmente pelo talento magnetizante do Fenômeno, gordo do jeito que estava. Na boa: o Pelé estava bem melhor do que ele em seu jogo comemorativo do aniversário de 50 anos. Aliás, deve estar melhor do que Ronaldo agora, e o cara jogava profissionalmente até uns quatro meses atrás. Não é à toa que a torcida do Corinthians já começava a protestar contra ele, quando anunciou sua aposentadoria. Mas tudo bem, já passou, eu não sou Corinthians, deixa pra lá.

Mas as chances criadas em sequência naquele curto espaço de tempo são a prova da diferença que faz um time ter a real vontade de produzir. Com ele lá, todo mundo resolveu trabalhar o mais sério possível pra tentar dar chance a ele de se despedir da Seleção com um gol. No resto do tempo, especialmente no segundo tempo, obviamente o interesse não foi o mesmo.


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Boa notícia mesmo foi a não convocação de Thiago Neves para a Copa América, evitando que o Flamengo fique desfalcado dele por tantas rodadas. Sinto pelo jogador, que provavelmente queria muito estar lá, mas pra mim é melhor assim. Tomara que o desejo de voltar a ser convocado o motive e o faça jogar mais.

8 comentários:

Luis disse...

André, vc manifestou o que muitos sentem: indeferença com relação à seleção, exceto Copa e jogo contra Argentina.

Um dos principais motivos vc também descreveu bem. Os jogadores de fato não tem qualquer conectividade com a torcida.

Além dos caras sairem do Brasil muito cedo, alguns jogam em times ou mercados bem fraquinhos na Europa. Imagino que tenha um bom motivo para eles serem convocados.

Mas, além disso, eu não consigo torcer ou acompanhar gente marrenta/babaca. Também já estou de saco cheio de cara que levanta a camisa na hora de comemorar gol para agradecer sei lá quem, que faz dancinha (que é coisa de criança ou de mané) etc, ao invés de comemorar com o time ou com a torcida. Esse é um problema inclusive no Mengão, mas pelo menos por aqui eu acompanho o time, conheço os jogadores etc - dá pra aturar.

Para piorar, parece que o Mano teve um ataque de Dunga ontem com a imprensa, além de ter fechado um grupo para a Copa América que não tem a menor conectividade/relação com o povo/mercado carioca.

Na Copa América, não vou chegar a torcer contra, mas vou preferir acompanhar o Meu Mengão, mesmo com todo o sofrimento que isso traz junto ... !!!

Paulo Sales disse...

Rapaz, belo texto, assino embaixo.
Acho que há algo de fake nessa idolatria a Ronaldo, por mais que goste dele - me parece um cara legal, gente boa, mas nem o considero assim tão genial. Acho que foi mais um jogador decisivo do que talentoso, que não se escondeu na hora mais difícil. Ídolo? Não, nunca. E fica cada mais difícil suportar o ufanismo tolo e o puxasaquismo institucionalizado de Galvão Bueno e sua turma.

Luiz Filho disse...

Escreveu tudo que eu pensei desde ontem. "Assisti" ao jogo lendo coisas mais interessantes e só levantava a cabeça para ver o jogo quando o Galvão gritava um pouco mais que o normal.
Fiz a merda de assistir a volta olímpica mais lenta de todos os tempos e o segundo tempo de bosta!
Resumindo me emocionei com a despedida do Pet (para mim jogador mais caro da História do Flamengo, mas que deu retorno esportivo) com a do Ronaldo não.
Ronaldo para mim, mais do que nunca é o de Assis e Angelim, o maior Ronaldo da História do Flamengo!
Rei Angelim I e Hexa!

Roberto de Moraes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Roberto de Moraes disse...

Rapaz, subescrevo cada palavra que escreveste. O que no meu entender é uma lástima em todos os sentidos (sobre o Ronaldo e sobre a seleção).
Outra coisa que decorre de seu texto, que acaba sendo também uma das minhas (muitas) preocupações pra Copa: a invasão dos não-torcedores de futebol durante os jogos... como diria um amigo meu: "A verdade é que torcida da seleção é torcida de vôlei". Convenhamos, o que leva um ser humano a gastar 140 reais em um ingresso de jogo de futebol da seleção brasileira e levar uma mini-televisão pro estádio?! Isso beira o inacreditável...
Por fim, quanto à não convocação do Thiago Neves - como qualquer rubronegro eu também achei excelente a não-convocação, o que retrata bem os sinais dos tempos que descreveste. Antigamente celebrávamos quando um jogador de nosso clube era convocado, era um baita orgulho. Hoje em dia, apenas atrapalha e até preferimos que não seja mesmo. E viva o Jádson, o mais novo "famoso quem?" da seleção...

EDILSON MENDES disse...

Também é óbvio. Como um flamenguista vai se emocionar com alguém a quem eles atribuem como traidor. Alguém que os deixou "chupando" o dedo. Desculpe-me, mas que postagem infeliz. Está me cheirando dor de cotovelo. Só o fato de relembrar o assunto significa que ele INCOMODA.

André Monnerat disse...

Edilson, repare que eu nem citei nada sobre a relação do Ronaldo com o FLamengo no texto. Ou seja: o seu "Só o fato de relembrar o assunto significa que ele INCOMODA" não faz sentido nenhum com o que escrevi.

Erlen e Luísa disse...

Assino embaixo e concordo com o Valente Filho. Me emocionei mais com a despedida do Pet do que com a do Ronaldo. Na verdade, assisti mais aquele jogo para ver se o Thiago Neves entraria, o que nao aconteceu. Jogo tedioso, como tem sido os jogos da Seleção nos últimos tempos.