Me engana que eu gosto?

Sendo sincero: ainda não assisti este ano a nenhum jogo do time-sensação da temporada, o Santos. Vi alguns gols, alguma coisa de melhores momentos, e só. Dorival Júnior é um bom treinador, gosto do que ouço falar sobre o estilo do time e até acredito que possa ser mesmo uma boa equipe.

No entanto, fico impressionado com o tom dos elogios aos "meninos da Vila". O encantamento sem ressalvas me incomoda um tanto, mesmo sem tê-los visto jogar até agora. E vou explicar o porquê.

Vou até tirar o Flamengo da parada, já que a grande maioria de quem chega aqui é rubro-negro. Mas imaginemos a situação: o Vasco monta um time repleto de meninos de sua base. Philippe Coutinho mostra futebol insinuante, um outro meia aparece sempre com bons passes, há ainda um centro-avante que aproveita bem as chances que surgem. E esta equipe começa a vencer com tranquilidade, embora com eventuais tropeços, seus adversários no Estadual do Rio: Madureira, América, Olaria, Tigres do Brasil... Nos clássicos, vitórias ou derrotas apertadas. Pela Copa do Brasil, vitória complicada fora de casa e, em São Januário, uma grande goleada sobre o Eustimop, de Roraima.

Tenho certeza que a torcida do Vasco estaria empolgada com seu time. Mas qual a porcentagem dos comentários da imprensa elogiando a equipe vocês imaginam que terminariam com algo como "é, mas o Carioca é uma coisa, Brasileirão é outra. É bom não se enganar com a fragilidade dos pequenos do Rio!"

E agora eu lhes pegunto: quando leram sobre a série de sei lá quantos jogos invictos do Santos contra Monte Azul, Oeste, Mirassol e similares, quantas vezes leram ressalva parecida?


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É um fenômeno que me chama a atenção, este: ano após ano, times e jogadores que se destacam no Campeonato Paulista têm dificuldades quando chega o Brasileiro, e a imprensa - especialmente a de São Paulo - se mostra incrivelmente surpresa, com discussões acaloradas sobre o motivo do Palmeiras "não recuperar o futebol brilhante do início do ano" ou da "queda de produção do Léo Lima neste segundo semestre".

De novo: pode ser que o Santos seja mesmo um belo time e nos encante ao longo da temporada; não estou afirmando que isso não vá acontecer. Mas, até agora, só jogou contra times muito fracos e, nos poucos clássicos que disputou, não aconteceu nenhum passeio. Sendo que a mesma imprensa que exalta o pessoal da Vila Belmiro é unânime em dizer que São Paulo, Corinthians e Palmeiras, os adversários mais fortes que o time pegou até agora, não estão jogando nada.

Já leio até alguns comentaristas pedindo a convocação para a Copa do Mundo de Neymar e Paulo Henrique Ganso. Vejam bem: eles são moleques, que podem estar evoluindo mesmo rápido; pra quem é tão novo assim, a sequência de alguns jogos pode mesmo fazer bastante diferença. Mas nenhum dos dois me impressionou tanto assim no ano passado, quando os vi jogar no Brasileiro. Neymar até me parece realmente habilidoso e objetivo, mas é franzino e não conseguia ser realmente decisivo nos jogos contra times mais fortes; Ganso, que dizem que é um raro meia clássico, me pareceu sempre pouco objetivo e muito preocupado em tornar suas jogadas e passes mais "bonitos" que o necessário. Será que o desempenho contra os pequenos de São Paulo é mesmo prova de que já chegaram ao nível da Seleção?

Acho que seria prudente esperar um pouco antes de tanta empolgação.


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Pra colocar as coisas em perspectiva: na série B do Brasileiro de 2009, o Duque de Caxias terminou em oitavo lugar, empatado com o São Caetano, à frente de Ponte Preta e Bragantino, atrás apenas de Guarani e Portuguesa.

14 comentários:

Bosco Ferreira disse...

O Gilson Ricardo disse um dia em off que a imprensa paulistana acha que o Brasil resume-se a São Paulo.

O fanatismo dos paulistanos aliado ao analfabetismo de alguns torna a imprensa paulista à beira do analfabeitsmo.

André Amaral disse...

André, vi alguns jogos do Santos, e é realmente interessante o modo deles jogarem.

Eles sufocom o adversário, atacam com seis jogadores e sempre na velocidade e com movimentação.

Ignoro todo fanatismo da imprensa paulista, não curto muito essas comemorações artificiais, e acho engraçado quando falam que isso é inveja das outras torcidas.

Porque gostavam e admiravam o Santos de Pelé? Quantas vezes o Santos já jogou no Maracanã lotado?

A torcida não curte essas palhaçadas, e não foi com a cara de Neymar.

Bosco Ferreira disse...

Quiz dizer: A beira do nacisismo preconceituoso.

Victor disse...

André,
eu vi dois jogos do Santos (Corinthians e Naivirahaurhiurhaisrh).
O que impressiona não são os resultados, e sim a forma como o time joga.

Ganhar ou perder, é consequencia. Impressiona que o time joga de fato diferente. E isso não é função da fragilidade dos adversários.

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Claro que já está todo mundo escolado que muito provavelmente o time cairá de produção e irá para a vala comum. Se de fato tiver qualidade, será competitivo, do contrário, será Botafogo 2007.

Freire disse...

Os paulistas são assim mesmo. Não lembra que eles fizeram campanha para emplacar André Santos e Douglas na Seleção Brasileira, quando eles arrebentavam na Série B? Patético. O Sócrates tem uma coluna na Carta Capital e pedia a convocação do Douuglas enquanto ele enfrentava Gama, Vila Nova, Brasiliense.

Marcos André Lessa disse...

André, essa diferença de tratamento entre o futebol paulista e o carioca é notória. Os times do Rio podem ter craques "comendo a bola", mas nunca terão chance na Seleção - a não ser os já rodados, como Adriano e Kléberson. Agora, se está em SP, é olhado de maneira diferente. E esse comportamento se reflete na imprensa.

Unknown disse...

Concordo 100% Andre, em todos os pontos colocados. Tenho exatamente a mesma impressão embora também não tenha visto nada ainda deles.

E isso me causa raiva, ao ponto de ter ficado feliz com a derrota desse time pro "poderoso" Palmeiras.

Fabricio C. Boppré disse...

Também acho, na falta de uma designação mais adequada, ridículo o lobby da imprensa paulista pela convocação de Neymar e Ganso. Apesar do precedente aberto pelo Ronaldinho em 94. Mas, não lembro, talvez em 94 não existissem outras alternativas melhores para a reserva de Romário e Bebeto, e não a toa Ronaldinho se tornou o Fenomeno. Já hoje, é lógico que existem jogadores com mais cancha para ir para uma copa do mundo, em comparação a Neymar e Ganso, e que não irão. Os dois santistas serão ótimos jogadores, sem dúvida (em especial, gosto muito do Ganso), mas pedi-los na copa, é sem noção.

Folha disse...

Vento que venta lá, venta cá. A mesma má vontade que eles tem com os cariocas nós podemos ter com os paulistas.

A boa imprensa de São Paulo elogiava as atuações do Fluminense na reta final do Brasileiro.

A má imprensa do Rio de Janeiro comete os mesmos disparates da paulista.

O Dorival ta escalando o time com 1 volante, 2 meias de criação e 3 atacantes, sem precisar analisar as atuações, essa maneira de escalar a equipe já é digna de aplausos.

Vejam os jogos sem a mesma má vontade que a paulistada vê os nossos...

Folha disse...

Apenas pra ilustrar, busquem na memória o que a imprensa carioca dizia dos fantásticos meninos do madureira, que depois foram pro clube da colina, Léo Lima e Souza.

André Monnerat disse...

Folha, o caso do Léo Lima e do Souza tem quantos anos?

Já faz muito tempo que nem a imprensa carioca se dá ao direito de elogiar um time daqui por conta do Estadual. O Renato Maurício Prado, se não me engano, é até o inventor da expressão "Me engana que eu gosto" pra chamar o campeonato. A própria imprensa daqui já faz todas aquelas ressalvas quanto aos Madureiras da vida, não estava falando só do pessoal de fora não.

E provavelmente nem estejam errados, aliás. O campeonato é fraco mesmo. O que me impressiona é que não se olhe com o mesmo senso crítico outros estaduais. Inclusive a própria imprensa daqui, que dificilmente critica o nível dos times de SP.

E não é só pro campeonato paulista isso não. Não faz muito tempo que todo mundo endeusou o time do Inter por um começo de temporada maravilhoso e invicto - só com goleadas na Copa do Brasil e no Gaúcho. Depois o time perdeu e ficou todo mundo se perguntando o porquê da "queda de produção". Porque ainda tem isso: ninguém diz depois que o nível dos adversários é que era baixo, falam que o time caiu de produção!

Quanto ao estilo de jogo do Santos, eu até citei isso no texto. Não vi, mas gosto do que ouço falar, acho maneiro que joguem pra frente, driblem, façam golaços e tudo o mais. Mas é bem mais fácil ser assim contra o Naviraiense do que contra o Grêmio ou o Cruzeiro. Vamos esperar pra ver se esse estilo vai se manter, e funcionar, ao longo da temporada.

Unknown disse...

Time do Dori é time de índio, todo mundo atacando sem organização, só serve pra ganhar estadual e segundona.

Marcos Monnerat disse...

Eu tenho certeza de que um time com um volante, dois meias e três atacantes só irá funcionar contra os Naviraienses e Paulistas de Jundiaí. A não ser que se consiga que esses meias marquem de verdade além de jogar (o que eu acho que não deveria ser difícil de acontecer, mas que no Brasil acontece porque os meias acham que são atacantes e não tem responsabilidades defensivas). E pelo menos dois desses atacantes também voltem acompanhando laterais e/ou cabeças-de-área dos adversários. Mais ou menos como jogava o Flamengo de 92.

Não vi nenhuma partida completa do Santos ainda, então não tem como eu falar se esse time tem potencial pra ser sensação de verdade contra times de verdade, mas sempre tenho um pé atrás com essas empolgações da imprensa.

Alexandre Giesbrecht disse...

Concordo 100% com o Folha. Não dá para pegar os piores exemplos da imprensa paulista e compará-lo com os melhores exemplos da imprensa carioca. Na verdade, o que mais ouço aqui em São Paulo é que o Paulista não serve de parâmetro para nada, isso já há quase uma década.

Isto posto, os elogios que têm sido tecidos ao Santos parecem-me exagerados. Nem tanto pelo futebol apresentado em si, que até é agradável de se assistir, mas porque não faz dois meses, e falava-se em preocupação quanto a rebaixamento no Brasileiro. Vejam o que a Placar escreveu em seu "Guia 2010", publicado em janeiro: "Assim como no ano passado, o Santos começa o ano sem botar medo. (...) o novo presidente dispensou mais do que contratou. (...) A aquisição mais comemorada é a de um ídolo: Giovanni, 37 anos, que não joga desde abril, quando deixou o Mogi-Mirim. (...) Ponto fraco: ataque. Sem Kléber Pereira, o setor ofensivo praiano — Zé Eduardo, Neymar, Fabiano, Maikon Leite, Wesley, André e Gil — ainda é o mais carente." Ok, a Placar não fala em rebaixamento, mas é um belo contraste em relação ao que se tem visto por aí ultimamente.

Agora, o que tenho muito a elogiar nesse time do Santos é justamente a postura nos 10 a 0. Foi contra um time que teria dificuldades numa eventual Série G? Sim, foi. Mas justamente por isso. A grande maioria dos clubes hoje para quando faz 4 a 0, em suposto respeito ao adversário, o mesmo adversário cuja existência eles ignoram nos outros 364 dias do ano. O Santos, não. Seguiu fazendo gols, respeitando, aí sim, sua própria torcida. Não duvido que outros times da Série A teriam se dado por satisfeitos ao marcar o terceiro gol, depois cozinhariam o jogo esperando o apito final. Curiosamente, quatro dias depois o time tirou o pé do acelerador quando jogava com um time de Série A, provavelmente achando que a fatura estava liquidada, e deu no que deu.