Minhas ideias para o calendário brasileiro - Parte 1

Meu último texto sobre os problemas do calendário brasileiro, que entre outras coisas faz os compromissos dos clubes baterem com os da Seleção, terminou com um humilde "sugestões?". Alguns de vocês deixaram comentários e, depois disso, intensificaram-se as notícias de que a Globo está fazendo força para o Brasileiro voltar ao formato de mata-mata. Pois bem: vou agora começar a dar os meu palpites.

Pra começar: não abandonaria os pontos corridos para o Brasileiro. A questão aí não é muito a "justiça" da competição, nem o gosto pessoal - e sim o modelo econômico da coisa. Imaginem um Brasileiro longo como o atual, com um mês e meio ou dois de mata-mata, e o que teremos é a maioria dos times da primeira divisão nacional ficando este período parados, justamente no momento mais valorizado do calendário. Ou seja: serão equipes que só jogarão nos dois ou três meses dos desvalorizados estaduais, mais os meses da fase mais monótona do Brasileiro, sempre com mídia menor, esperando pra sumir na hora em que todo mundo se interessar pra valer. Como se sentirão os patrocinadores destes times? É claro que os valores destes contratos irão despencar.

Hoje, todos os times das séries A e B têm compromissos garantidos ao longo de todo o ano, o que aumenta na média a receita de bilheteria de todos e facilita a negociação de seus contratos - o patrocinador do Avaí, por exemplo, sabe que terá sua marca aparecendo na mídia de Santa Catarina até o fim do ano, o que não aconteceria no formato antigo. No duro, já há gente demais no Brasil que vive do futebol e é obrigada pelo calendário a ficar sem trabalho por meses e meses - é o caso dos times todos das séries C e D nacionais, mais os clubes locais todos que vivem em função dos estaduais.

A Globo parece não se dar conta de que o calendário hoje já tem competições com mata-mata: os estaduais e a Copa do Brasil. O que falta é encontrar fórmulas para valorizá-las, tornar seus jogos decisivos mais atraentes - e não "decisões de segunda linha", como são vistos atualmente. Hoje, com a desvalorização dos estaduais, o fim dos regionais e o empobrecimento da Copa do Brasil, há uma disparidade grande demais entre o valor do Brasileiro e todas as outras competições que 99% dos clubes disputam. Com o tempo, com o enfraquecimento das disputas regionais, a tendência é que isso contribua bastante para concentração de forças no país entre poucos clubes, como já aconteceu nos países todos da Europa e, reparem, já começa a ocorrer em nível continental.

Com a disparidade cada vez maior de grana rolando na Champions League em relação aos demais campeonatos, aqueles que se dão bem com frequência na competição já estão formando uma casta superior de superpotências em número limitado - todos os outros já estão com dificuldades para acompanhar Barcelona, Real Madri, Manchester, Liverpool e Chelsea (este por causa de Abramovich). Quem fica de fora um ano que seja da competição já sente um prejuízo gigantesco, como ficou claro no caso do Milan. Por aqui, quem se distancia da disputa ao menos de G4 no Brasileiro vai ficando cada vez mais um nível abaixo dos outros, com menos chance de recuperação por não ter outras competições importantes em que se apoiar.

Pra mim, qualquer proposta nova de calendário para o Brasil precisa encarar esta questão, além de procurar garantir ao máximo possível de profissionais do futebol - e não falo aí só de jogadores, mas também de treinadores, massagistas, repórteres, fotógrafos, vendedores de biscoito, bilheteiros - atividade para o ano todo.

Mais tarde eu coloco por aqui meus palpites mais objetivos pro que poderia ser feito - e vocês podem dizer o que acham.

2 comentários:

Gustavo Ottoni disse...

Caro André,
Permita-me discordar quanto ao mata-mata. Acho que desde que o Brasileirão virou pontos corridos virou o monótão! Sou da teoria que futebol é espetáculo e não prêmio Nobel. Tem que ser justo, mas tem que trazer paixão, falta a emoção do jogo decisivo, do clima de final. Acho certo valorizar o clube que tem poder de decisão. Mas, acho que não pode passar de apenas semi-final e final, 4 datas e pronto, seriam 2 semanas sem exposição para os patrocinadores. Algumas vezes, a seleção joga quarta e domingo, e os clubes ficam 10 dias parados de qualquer forma. Será que o patrocinador do Avaí ficará realmente satisfeito de passar 1 mês ou 2 jogando só para encher tabela?
O interessante é que eu tenho uma teoria exatamente oposta à sua, quanto à elitização dos clubes. Na época do mata-mata, tínhamos uma variedade maior de clubes lutando pela ponta. Um botafogo beliscava aqui, ou Atlético/PR ou até o São Caetano. Hoje, nos pontos corridos são sempre os mesmos. Um ou outro tem um ano ruim, mas na ponta estão os mesmos, justamente porque o azarão tem poucas chances de chegar. Não é à toa que nos campeonatos europeus, que usam os pontos corridos, só há espaço para no máximo 4 forças. Anote aí, em 10 anos, não teremos muito mais que isso, disputando o título de verdade se continuarmos com os pontos corridos.

André Monnerat disse...

Gustavo, pode crer que o patrocinador do Avaí está mais satisfeito agora, com o time dele tendo motivo pra aparecer na mídia de Santa Catarina toda semana (e mobilizando a torcida deles lá, que está indo bem ao estádio) do que se estivesse parado. Isso é fato: desde que os pontos corridos começaram, as receitas de patrocínio e bilheteria, em média, todas subiram.

Mas olha, eu não falei que é o mata-mata que vai concentrar força em poucos clubes - não é por aí, e essa concentração já começou a acontecer agora, com pontos corridos.

O que eu disse que está levando a isso é a diferença cada vez maior de valor entre o Brasileiro, longuíssimo e muito mais valorizado, e todas as outras competições do calendário. É isso que levou à concentração de forças em cada país europeu e é isso que está fazendo isso agora por lá em nível continental.

Sendo pontos corridos ou mata-mata, se você não tiver uma distribuição melhor de valor entre mais competições, com mais gente tendo chance de ganhar estas diferentes opções, esta elitização vai acontecer.

O que evitava um tanto isso aqui no Brasil não era o mata-mata no Brasileiro, e sim o fato de que ele durava a metade do tempo, os Estaduais eram muito mais valorizados, havia a Copa do Brasil com todo mundo jogando e por aí vai.