Eu não gosto da idéia, mas nem vou entrar muito nesse mérito porque é uma realidade muito, muito distante. Vou só aproveitar o mote pra contar uma história que li há um tempo atrás, em uma ótima matéria da Piauí sobre o futebol inglês - podem ler clicando aqui, mas é preciso antes se cadastrar no site da revista. Vale a pena; a historinha abaixo é só um detalhe.
Desde 1991, o Manchester United tinha ações à venda na Bolsa de Valores de Londres. Foi a solução encontrada para levantar dinheiro em uma época de crise no futebol inglês (a que levou à virada que deu na milionária Premier League de hoje). Não havia um dono, mas sim vários acionistas - entre investidores com parcelas maiores e torcedores que foram à bolsa comprar um pedacinho de seu time de coração. Porém, a partir de 2003, o milionário americano Malcolm Glazer, dono do time de futebol americano Tampa Bay Buccaneers, começou a adquirir ações - cada vez mais, até finalmente assumir o controle. Em 2005, ele finalmente conseguiu tirar as ações do Manchester da Bolsa; o clube voltou a ter um dono.
Muitos torcedores se revoltaram por ver sua paixão ser comprada por um capitalista dos Estados Unidos, um país onde nem sabem direito o que é futebol. A insatisfação aumentou quando Glazer começou a aumentar, e muito, os preços dos ingressos para os jogos, como forma de recuperar parte de seu milionário investimento. Até hoje, há aqueles que cantam contra Glazer em Old Trafford, e outros que decidiram só ir a jogos fora de casa. Um grupo foi ainda mais radical: decidiu simplesmente largar o Manchester United e partir pra outra. Mas nada de escolher torcer para o Manchester City ou outro rival qualquer.
Começou com uma reunião de torcedores descontentes no Salão Metodista de Manchester, em que eram discutidos planos para fazer oposição a Glazer. Surgiu a proposta de fundar um novo clube, e decidiu-se que ele seria fundado se conseguissem juntar, em dois meses, mil pessoas dispostas a dar apoio financeiro à idéia. A meta foi ultrapassada e assim, em 14 de junho de 2005 - pouco mais de um mês da formalização do takeover de Glazer -, foi fundado o FC United of Manchester.
O clube abriu seleção para formar sua primeira equipe doze dias depois da fundação. 900 jogadores se inscreveram para o processo, dos quais sobraram 17 no elenco. Na Inglaterra, há uma organização de 10 níveis até se chegar à Premier League - os mais baixos são formados de maneira regional. O FC United estreou na Liga dos Condados do Nordeste em 13 de agosto de 2005. A Federação os colocou como visitantes em seu primeiro jogo, contra o adversário com maior estádio da liga, pra testar se haveria como os outros times o receberem em suas casas sem transtornos com excesso de público. Foram 2.590 pagantes, um recorde na história da competição. E o FC United acabou se sagrando campeão em seu primeiro ano, subindo assim de divisão.
O mesmo aconteceu na temporada 2006-2007. E, em 2007-2008, foram vice-campeões e conquistaram mais uma subida nos playoffs. Ou seja: subiram três divisões em seus três primeiros anos - uma meta que havia sido planejada em seu Annual General Meeting de 2006. Outro objetivo traçado é o de construir seu próprio estádio, com capacidade entre 7.000 e 10.000 pessoas, até 2012. Nesta temporada, o FC United está com 51 pontos em 33 partidas - 4 pontos abaixo da zona de classificação para os playoffs que decidem a vaga na divisão acima.
O FC United tem definido, em seu estatuto, que deverá ser sempre propriedade de seus sócios - nunca de um indivíduo ou de uma empresa. No momento, eles fazem campanha para atrairem novos sócios, que poderão votar em decisões na assembleia anual de 2010. Na deste ano, por exemplo, será resolvido se farão um concurso entre os sócios para escolher o novo design do uniforme ou se manterão o desenho atual por mais uma temporada. E foi na primeira delas, em 2005, que foi decidido que a camisa do time profissional não pode ter patrocinador. Nestas assembléias, cada sócio tem um voto - todo mundo com o mesmo peso.
Contribuindo com sua taxa anual de sócio - apenas 10 libras para adultos e 3 libras para crianças -, você contribuirá não apenas com o clube e seu futuro, mas também com nossa visão de mudar a maneira como o futebol é dirigido e de devolvê-lo às mãos dos torcedores comuns.
5 comentários:
Os caras estão na sétima divisão e têm um site melhor que o nosso...
Muito bom o post sobre uma ótima matéria, de uma excelente revista.
Prezado Monnerat. Parabéns pelo post. Muito interessante.
O Márcio Braga costuma dizer que o Flamengo não pode, hoje, se transformar num clube empresa porque nasceria falido, no que tem completa razão.
Da lição do FC United, podemos concluir que uma das soluções para o Flamengo seria um bom projeto de sócio torcedor, capitalizando a força da torcida. Outros projetos semelhantes poderiam se unir a esse.
Não sou da área de marketing (deixo isso para especialistas como você), mas calculo que, para isso acontecer, é preciso que o proponente tenha CREDIBILIDADE, algo que, infelizmente, a nossa diretoria não tem.
Acho, então, que o Flamengo precisa de um bom administrador na presidência, um profissional de marketing competente e um nome que possa atrair credibilidade para um projeto como esse.
Parece que estamos longe de antingir esse patamar, não é?
Grande abraço.
Completando, gostaria de fazer algumas observações a respeito do autor da idéia da "venda" do Flamengo.
O que faz Leonardo no Milan? Alguém sabe definir com precisão?
Ele é olheiro? Representante do Milan para negociações de atletas? Representante do Milan para projetos sociais? Quais seriam eles? Relacionados com a tal Fundação Gol de Letra?
Enfim, por acaso o Leonardo participa efetivamente dos projetos de Marketing do Milan? Da administração das receitas e despesas do clube? Aliás, dizem, a atual gestão do Berlusconi tem endividado bastante aquele clube...
Então, acho que é preciso muita cautela antes de "fechar" com o nome do Leonardo. Ele, até agora, não me convenceu, sinceramente.
SRN a todos.
Eu gosto do Leonardo. Parece sempre um cara ponderado, inteligente, culto. Porém, a simples idéia de vender o Flamengo me dá calafrios. É um negócio que eu não sei se conseguiria me acostumar.
Acho ainda que o modelo europeu não é um bom modelo. Gostam de comparar com o americano, mas não é a mesma coisa. Nos EUA, o mercado é muitíssimo controlado e regulado, coisa que não acontece na Europa - por conta disso, o futebol europeu é muito desequilibrado, tem um modelo que privilegia a concentração de forças e dá espaço para a entrada de todo tipo mafioso, em busca de depósitos de seu dinheiro de origem duvidosa, sabe-se lá com que objetivo.
E, além do mais, a conta por lá não fecha. Não sou eu que estou dizendo - foi o próprio Leonardo quem disse, em entrevista ao Sportv há um ou dois anos, que as contas do Milan não fecham e dependem de injeções de dinheiro "de fora" do Berlusconi. É isso? A idéia é o Flamengo ficar dependente de algum mecenas? Eu não gosto.
E sobre o projeto de marketing - eu acho que, mais que credibilidade, a torcida embarcaria em algo que valesse a pena pra ela. Não adianta contar só com a paixão. As pessoas gastam no que elas acham que compensa. Por isso é que, nos últimos dois anos, o Flamengo colocou 40 mil pessoas por jogo no Maracanã, mesmo com Kléber Leite e tudo o mais - porque achavam que valia a pena gastar aquele dinheiro pra ver os jogos. Se achassem que não tava valendo o preço, não iriam.
É isso: tem que desenvolver um produto que valha a pena para o seu público. Simples assim. Enquanto continuar só na base da camiseta-salvação, pulseirinha-salvação, chaveirinho-salvação e por aí vai, nunca vai engrenar.
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