Márcio Braga x Patrícia Amorim. Temos que escolher lado?

No Flamengo de tão poucos, o cansativo exercício de tentar escolher o menos pior. Até quando?


* * * * * * * * * *

Tenho certeza que a grande maioria dos leitores deste blog prefere textos sobre futebol a falar sobre política do Flamengo. Os bate-bocas e disputas pessoais que surgem lá de dentro são mesmo muito chatos. Infelizmente, porém, acabam influenciando no que vai acontecer com o time dentro de campo em algum momento. Por isso, vou tentar ao mesmo tempo não deixar o assunto passar, mas não me alongar demais neste texto. Sintam-se à vontade pra pular fora a qualquer momento, se eu não conseguir, ok?

Ontem o GloboEsporte deu grande destaque a uma entrevista bombástica de Márcio Braga, que aproveitou a sequência ruim do time no Brasileiro para criticar duramente a gestão de Patrícia Amorim. Muitos torcedores e sócios insatisfeitos com a diretoria vibraram. "Finalmente alguém falou o que precisava ser dito!" E ele até pode estar certo em boa parte do que falou (não gosto especialmente dessa de "há suspeitas de corrupção" - se tem algo concreto, fala; se não tem, não deixa no ar, é leviano). A resposta de Patrícia foi basicamente dizer que Márcio Braga mentiu e completar desqualificando-o, falando mal de sua gestão e seu comportamento.

Vamos colocar as coisas em perspectiva: Patrícia Amorim foi Vice-Presidente de Esportes Olímpicos nomeada por Márcio Braga. Seu vice, Hélio Ferraz, foi convocado às pressas por Márcio Braga para, junto com Kléber Leite, salvar o futebol que estava à beira do rebaixamento em 2005. Neste Flamengo de tão poucos, as pessoas quase todas se misturam em algum momento, brigam, daqui a pouco voltam a estar juntos. Nada é tão simples assim.

Márcio critica o futebol entregue às mãos de Luxemburgo (eu também não gosto), mas deixou o departamento inteiramente por conta de Kléber Leite por anos, depois de quase levá-lo à segunda divisão. Fala do aumento da folha salarial e do estouro da dívida em 2010 (que é mesmo preocupante), mas em 2008, nas mãos de Kléber Leite, os gastos do futebol do Flamengo cresceram 74% de um ano para o outro, fazendo com que a dívida aumentasse em quase R$40 milhões. Diz que o estatuto deveria ser mudado e que é preciso ampliar largamente o número de sócios votando (no que concordo muito), mas nada fez para isso enquanto esteve lá e chegou a dizer com todas as letras a Arthur Muhlemberg, no programa que ele tinha na FlaTV, que atrair mais sócios não era solução nem prioridade para o Flamengo - é pena que a FlaTV não esteja mais no ar, para que eu possa resgatar o vídeo disso.

Critica-se hoje o marketing do Flamengo e seus problemas para arrumar patrocinadores, mas vimos com Márcio Braga o contrato com a Petrobras ser renovado ano após ano, com valores que pareciam cada vez mais defasados e que o clube tinha enormes dificuldades legais para receber, o que gerava um problema grave em sua vida financeira. Suspeitam que Patrícia muitas vezes esteja agindo pensando mais em sua carreira política do que no Flamengo, mas o mesmo foi dito de Márcio Braga quando resolveu ser deputado federal, no fim dos anos 80.

Finalmente: Márcio fala mal do tratamento dado a Zico (e eu concordo muito), mas esquece que, quando trouxe Júnior para dirigir o futebol, colocou acima dele um vice-presidente seu vice-presidente geral o boicotava ostensivamente, dava entrevistas desautorizando-o de maneira até desrespeitosa (coisas como "eu sou o capitão, e o capitão não dá satisfações ao marujo") e chegou a contratar Dimba por uma fortuna, à revelia do antigo ídolo, pra mostrar de vez quem é que mandava. Se Patrícia não deu autonomia a Zico, Márcio deu menos que isso a Júnior. A diferença das situações é que Júnior não sofreu com acusações de desonestidade como Zico. Mas vale lembrar que Patrícia Amorim nunca poderia demitir Capitão Léo do Conselho Fiscal, pois ele foi eleito - Márcio Braga poderia mandar embora Arthur Rocha, a quem nomeou como vice-presidente de futebol, quando quisesse. Erro meu no texto original: na verdade, Arthur Rocha era vice-presidente geral do clube, eleito na chapa de Márcio Braga, e não podia ser demitido. Fez o que fez com Dimba aproveitando-se de uma das muitas ausências de Márcio Braga, no que foi apenas um dos casos de boicote da "ala amadora" da diretoria aos profissionais do futebol. Márcio nunca repreendeu seu vice ao retornar ao clube e quem acabou caindo foi Júnior.

(Ah sim: Arthur Rocha hoje está entre os que apoiam Patrícia Amorim... Todos se misturam, nada é tão simples.)

Não quero dizer com isso que Márcio Braga só tenha agido mal no Flamengo. Não: é fato que ele tem muitos serviços prestados ao clube ao longo dos anos. Lá atrás, participou de um movimento que realmente renovou a política e a gestão do Flamengo. Também assumiu o rojão em momentos muito complicados, quando o clube não tinha nem talão de cheques, e conseguiu ir fazendo a vida voltar minimamente à normalidade. E, lógico, conquistou muitos títulos, alguns dos mais importantes da história do clube.

Só é bom ter em vista que, se não está bom hoje (e não está mesmo, embora Patrícia também tenha seus méritos - como no CT, ou no esforço para resolver a questão do Morro da Viúva), isso não quer dizer que devamos simplesmente voltar ao que era antes. Dependendo do ângulo que se olhar, um pode parecer "menos pior" que o outro. Mas tem que ser possível ir além disso.

O Flamengo precisa descobrir outros caminhos.

(Encerrado o texto, recebo por e-mail o link contando que quem defenderá José Carlos Peruano na comissão interna que discutirá no clube a sua agressão a Arthur Muhlemberg será Michel Assef - sempre aliado de Kléber Leite, presente por muito tempo no departamento de futebol de Márcio Braga. Como eu disse: todos se misturam, nada é tão simples...)

7 comentários:

Eduardo Varanda disse...

Monneratt... ufa... até que enfim um texto sensato sobre tudo isso. Já estava desesperado assistindo manifestações de todos os lados defendendo MB como se fosse nossa salvação... Sua análise não poderia ser mais completa.

Eduardo H. Costa disse...

Eu até prefiro os textos de política pra entender e saber o que precisa ser mudado.

O futebol dos últimos 15 ou 20 anos perdeu a graça pra MIM.

Não se pode ter espaço no clube para amadores brigando pelo poder e deixando o Flamengo de milhões de torcedores de lado.

Jorgete disse...

belo texto !

Eduardo Costa, faço minhas as suas palavras. estou de saco cheio desse futebol mediocre dos ultimos anos.

Jorgete Chagas

Gustavo disse...

Não sou nenhum especialista na política flamenga, mas me animei bastante com a chapa encabeçada pelo João Henrique Areias no último pleito. Pena que para formar uma chapa seja tão custoso no número de participantes e no final ele acabou sendo abandonado por parte do grupo que o apoiava. Enfim, estou com você, torço por uma terceira via. Posso pecar pela ingenuidade, mas torço para surgir um terceiro nome ganhando força nos próximos 12 meses. Acho que as críticas de ambos os lados (MB e PA) são pertinentes e por isso não gosto de ver nenhum dos dois por mais tempo. Gostaria mesmo de ver gente mais profissional e menos política.

Por fim, queria deixar um desabafo. Que facilidade tem a atual mandatária de mentir e subestimar a nossa inteligência. Ela fala que não tem rabo preso com ninguém, mas tem amplo apoio. Paga as dívidas, mas tem luvas atrasadas e o Marítimo cobrando um acordo feito recentemente. É participativa, mas estava quietinha diante desse turbilhão com falta de resultados, críticas de ídolos e até agressão na Gávea...

Enfim, pobre Flamengo tão querido por seus torcedores e tão maltratado por seus dirigentes!

Bosco Ferreira disse...

Também torcí pelo Areias, e acompanhei por aqui toda a pre eleição do Flamengo. Com a chapa do Areias iviabilizada pelo estatuto acabei torcendo pela situação comandada pelo sopa de letrinhas que vinha com uma boa sinalização.

Prefiro postes que falam em política interna do que em futebol, aliás, acho que o bom desempenho dentro do campo tem muito a vêr com a política e a administração do clube.

Segundo o próprio Márcio Braga, o Cabo Léo é um "aspone" da Patrícia Amorim lá na câmara, e o peruano é pau mandado la da cozinha do cabo Léo. É o cara que banha e leva os cachorrinhos do Léo para passear.

Saulo disse...

Creio que a parte boa da torcida queria o Areias. É uma pena que a parte mal do Fla jogou areia no projeto.
André, nessa confusão, alguém disse (acho que a PA) que o Zico apoiou o Delair. Achei estranho, pq no Blog do Milton Neves, à época, foi o filho de Delair que acusou o Zico. Essa acusação de PA procede?
Outra: Vc tem informação se o Areias ainda tem a intenção de se candidatar?

André Monnerat disse...

Saulo, não sei se dizer que o Zico apoiou o Delair é exatamente uma acusação - cada um tem o direito de apoiar quem quiser. Mas realmente não lembro dele fazer campanha pra ninguém não e você está correto: quem espalhou denúncias contra o Zico, usadas pelo Capitão Léo, foi o André Dumbrosck, filho do Delair. Depois, durante o processo interno que abriram contra o Zico, o André Dumbrosck foi convocado pra falar de suas acusações e, pelo que eu soube, simplesmente não apareceu. Parece que aí ele mesmo é que sofreria um novo processo interno por conta disso...

E pelo que sei, o Areias não queria se candidatar nem naquela eleição. Aceitou fazer este papel porque o grupo que o apoiava não estava conseguindo encontrar nenhum outro nome.