Os sócios e os ingressos

Como comentei no último texto, boa parte do debate exibido na noite de quarta-feira pela Rede Vida, do qual participaram Plínio Serpa Pinto, Delair Dumbrosck e Clóvis Sahione, foi dedicada à sede da Gávea e em pensamentos para atrair mais sócios.

Clóvis Sahione focou muito na necessidade de "trazer de volta" o time profissional à Gávea. É lá que ele quer ter o CT para o time principal, para que o sócio "sinta o cheiro" dos atletas. Segundo ele, isso serviria para levar os sócios ao clube, para assistir aos treinos, conviver com os ídolos. O que é realmente estranho na proposta é que os profissionais do Flamengo só passaram a frequentar o Ninho do Urubu mais assiduamente muito recentemente; mesmo esse ano, até certa altura, a enorme maioria dos treinos foi na Gávea. Quer dizer: a proposta de Sahione não é essa mudança toda. Mas ele também fala em um novo restaurante por lá, reformas nos banheiros e outras benfeitorias.

Plínio já foca totalmente na remodelação da sede: um grande restaurante panorâmico com vista pra Lagoa, uma mega-academia, enorme ampliação das vagas de estacionamento. São propostas mesmo mais de acordo com o que um espaço nobre como o que o Flamengo dispõe na Gávea deveria ter. Eu, pelo menos, gostaria muito de ver alguém falar com entusiasmo em um ginásio multi-uso moderno por lá, com a capacidade bem dimensionada, que pudesse servir de casa para o basquete e outros esportes olímpicos do Flamengo e ainda abrigar shows e eventos.

Delair soltou a informação de que, até hoje, não foi possível ocupar o prédio da sede da maneira que Plínio propõe por deficiências de estrutura - e isso agora estaria resolvido, porque o reforço necessário foi incluído no processo das obras da megaloja FlaConcept. Assim, ele até falou ter pronto o projeto de um grande restaurante por lá a ser implantado no próximo mandato, mas no geral suas propostas são bem mais modestas - como a criação de uma nova sala de carteado, por exemplo.


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Mas, nesse papo todo de como atrair sócios, falou-se muito da estrutura física da Gávea, mas não no relacionamento que o clube tem com seus sócios. A comunicação com eles, por exemplo, é mais do que deficiente - é quase inexistente. Mas vou agora pegar como exemplo a questão da venda de ingressos.

Vejam bem: ingresso pra jogo é o produto que o Flamengo mais vende e que, provavelmente, mais lhe dá dinheiro. E, ainda assim, ele simplesmente não sabe vender este produto. Os pontos de venda são pouquíssimos, o processo da venda é lento, a sinalização é ruim, a venda online não existe, o sistema cai com frequência, não aparece ninguém do clube pra dar satisfação nenhuma quando acontecem problemas, enfim.

Mas vamos aos sócios. O sócio do Flamengo, que compra um título por no mínimo R$6.540,00 ou paga uma mensalidade a partir de R$105,00 para frequentar uma sede reconhecidamente deficiente, tem como único benefício para adquirir ingressos poder fazê-lo dentro da Gávea. O preço é o mesmo do cidadão comum - cliente Itaú ganha meia, sócio do Flamengo não. A abertura da venda também acontece no mesmo dia. Há inúmeros exemplos de clubes no Brasil bem mais anteciosos com seus sócios nessa questão, não vou nem me dar ao trabalho de citá-los.

Ontem, dia em que se abriram as vendas para o Flamengo x Grêmio da última rodada, havia apenas um "guichê" de venda para os sócios lá dentro, com um computador lento e duas funcionárias mal treinadas - podia levar até minutos para uma pessoa efetivar sua compra (não é exagero - fui marcar no cronômetro o tempo que levou uma menina para sair com o ingresso e parei de olhar quando passou de cinco minutos).

Com a grande procura, a fila ficou enorme e simplesmente não andava - era coisa de meia-hora pra dar dois passos pra frente. Ao longo do tempo, ao menos surgiu uma espécie de solidariedade entre os que lá estavam; qualquer espertinho que tentava furar a fila era imediatamente barrado aos gritos por todos. Quando finalmente saí com meus ingressos na mão, depois de inacreditáveis 5 horas de fila, já me sentia até meio amigo dos que estavam à minha volta. Ao menos o perrengue era absolutamente democrático: perto de mim na fila estavam funcionários do marketing do Flamengo, perdendo seu dia de trabalho assim como eu, e até mesmo o Diretor de Eventos do clube.

(Obviamente, quando parti da Gávea de carro para o trabalho, tendo como almoço um salgado devorado na fila, vi que a situação do lado de fora era ainda pior.)

O sócio que se sentir insatisfeito com a situação tem uma maneira simples de melhorar sua vida para adquirir ingressos: além da mensalidade que já paga, assumir mais uma, a de Cidadão Rubro-Negro Ouro, pra ter na mão o famoso Passaporte Rubro-Negro (mas gostaria de ouvir relatos sobre ele efetivamente funcionando na prática - alguém aí tem e já usou?). Só com a reles condição de sócio e todas as despesas que ela acarreta para pouquíssimo retorno, nada feito.


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Taí, portanto, um belo tema a ser tratado em debate pelos candidatos à presidência do Flamengo: em quanto tempo pretendem mudar radicalmente a forma do Flamengo vender ingressos para seus jogos? E como pretendem lidar com os sócios do clube nesta questão?

Uma boa oportunidade será o debate que será promovido pela Rádio Globo e Globoesporte.com na próxima terça, às 17h, com mediação de José Ilan e José Carlos Araújo. Para este, todos os candidatos foram convidados - e, dessa vez, Patrícia Amorim avisou que vai.

6 comentários:

Roberto de Moraes disse...

André,
Ontem eu passei por lá por volta de meia-dia, ao ver o tamanho da fila, resolvi perguntar a alguém que estava mais próximo da entrada do hall principal (que ainda era longe do ponto de venda) - ao ser informado que a pobre alma estava lá já há três horas, desisti e voltei pro trabalho. Assim como você, acho um absurdo completo que nós sócios sejamos tratados como nada, sem preferência de compra dos ingressos. Eu até tenho o famigerado Passaporte Rubronegro também, mas é aquela coisa, essas coisas precisam ser "testadas", ou seja, preciso comprar um ingresso para um Flamengo x Macaé para ter certeza que a coisa funciona direito - com essas coisas de Flamengo, sou mesmo bastante reticente.
Ao menos eu consegui tranquilidade para anteontem comprar meu ingresso pro jogo contra o Corinthians - veja como eu sou mané, sou tratado mal e ainda por cima vou por conta própria pra Campinas. Tem coisas que a gente faz por esse clube que não dá mesmo pra entender...

Marcos Monnerat disse...

É simplesmente inaceitável a forma como o clube trata os seus torcedores. Especialmente os seus sócios.

Tenho certeza que os sócios das torcidas organizadas garantem com muito mais tranquilidade os seus ingressos, com desconto de 50%, sem filas e sem estresse. Aí, metade desses ingressos serão repassados para cambistas que venderão por três vezes o preço cheio dos ingressos.

Não adianta vir defender as organizadas porque não tem defesa. Pegam os ingressos e revendem para ganhar dinheiro. Um absurdo! Enquanto isso torcedores de verdade, que pagam mensalidade de sócio do clube, gerando renda de fato ao Flamengo, passam por essa desgraça pra comprar ingressos.

Acho que era o caso de se fazer um movimento de sócios do clube para forçar a diretoria a mudar de atitude. Coisa de fazer piquete na sede mesmo, pressionar os caras na base da gritaria. Fazer tocaia na frente da sala do presidente para que ele sofra pelo menos algum constrangimento por tratar tão mal a quem o elege.

Bruno Petrocelli disse...

Apesar de ser leitor do seu blog nunca havia comentado em seus posts. Porém, após ler seu comentário sobre "quem tem o passaporte rubro-negro e conseguiu usá-lo?". Então, eu sou Cidadão Rubro-Negro Ouro e tenho o "tão famigerado" Passaporte Rubro-Negro. Fiquei sabendo que todos os que possuem esse passaporte foram contactados por telefone para saber se os mesmos iriam querer ingressos para o jogo Flamengo x Grêmio. Porém, eu não fui contactado. Aliás, eu já havia mandado e-mails para a equipe do Cidadão Rubro-Negro perguntando se eu já poderia usar e como eu usaria o cartão e eles responderam assim "Sim. Já está aceitando na Internet, Call Center e pontos normais de venda.". Ora, e eu lá sei qual o telefone do call center e como que eu compro via internet? Fiquei indignado e mandei um outro e-mail, esse respondido apenas 1 semana depois, perguntando o telefone do Call Center e como usaria o cartão via internet. Eles responderam apenas como eu uso o cartão via internet e o pior, após o início das vendas para o jogo do Flamengo. E na maior cara de pau do mundo dizendo para eu mandar e-mail para eles pedindo a compra. Só que já não tinha mais como fazer isso porque eu já havia enfrentado 5 horas de fila para comprar o meu ingresso. E o pior, comprei cadeira azul quando queria arquibancada. Enfim, fiquei indignado com os serviços prestados por eles e, como não tem como cancelar, não renovaria o contrato após o termino deste, que ocorrerá, no meu caso, apenas em outubro do ano que vem. Abraço de um torcedor apaixonado pelo Flamengo, mas indignado com a maneira que ele trata todos os seus torcedores, inclusive os que ajudam o time tirando dinheiro do próprio bolso e pagando, diferentemente deles, tudo em dia.

Adriana Fernandes disse...

... sem contar que o número de ingressos por sócio também foi reduzido...

Juan disse...

André, agora faça um mea-culpa: você mesmo fez aqui, neste blog, aquela proposta do 3-em-1, do pacote para os 3 jogos finais, na falta de fé que o Flamengo chegaria sem chances a essa etapa do certame. Imagine a confusão não daria caso tal ideia fosse acatada.

Acho que qualquer crítica, por mais que seja válida, ao fornecedor de ingressos do clube, deve sempre levar em conta a imensa desproporção entre oferta e procura para um jogo cercado de absurda expectativa pela torcida do Flamengo - a mesma que exaltamos pelo seu tamanho e pela sua força de mobilização .

Eu comprei meus ingressos para o jogo com o Goiás, no segundo dia de vendas antecipadas, e com tranquilidade. E também foi um jogo que recorde de público pagante. O que fala muito da descomunal demanda para esse jogo. Houvesse 500.000 bilhetes, em 50 pontos de venda no Rio e em outros estados, a confusão seria semelhante.

Quanto à internet, não desconsideremos que mesmo a Receita Federal, no dia 30/04, tem dificuldades para aceitar as declarações de IR que se avolumam num só dia.

Quanto a cambistas, o problema é universal. A CBF, certa vez, fez para um jogo da seleção brasileira (Brasil x Uruguai, em Curitiba), a experiência de vender mediante apresentação de RG - uma mesma pessoa poderia comprar apenas sua cota. Mas teve cambista do mesmo jeito.

André Monnerat disse...

Juan, se a ideia da venda antecipada dos três jogos de uma vez tivesse sido acatada, estaríamos agora na mesma situação: com os ingressos todos do jogo de domingo esgotados antecipadamente. Não vejo que confusão daria agora.

E eu não falei nisso na época por ter medo do Flamengo não chegar - afinal, há semanas que eu coloco aqui a projeção pro fim do campeoanto, e sempre coloquei com o título sendo decidido na última rodada e a gente na briga.

Eu falava nisso porque sentia que já havia na época demanda para os três jogos. Vender antes seria atender essa demanda e dar mais conforto ao cliente do Flamengo, que pegaria fila uma vez só, em vez de três. Seria menos esforço pra todo mundo - inclusive para o clube e a IngressoFácil, que se mobilizaria menos pra vender ingressos. Você comprou tranquilo contra o Goiás, eu também - se estivessem vendendo naquela hora o do Grêmio, teria me poupado 5 horas de fila em horário comercial.

Claro que a demanda por ingressos de um jogo como esse do FLamengo é muito maior que a oferta. Mas se aumentassem os pontos, é bem razoávle supor que as filas de 5, 6, 7 horas diminuissem muito de duração. E caramba, não precisa ir longe - o esquema de venda do Botafogo é muito, muito melhor que o do Flamengo. Eu vejo sim muitos, muitos defeitos no esquema atual, bem mais do que acho razoável.

O possível ponto negativo naquela venda antecipada seria apenas, mesmo, a questão do preço, que o Flamengo pôde aumentar vendendo depois. Mas estaria atendendo seu público muito melhor.