Teto salarial no futebol?

A recusa de Kaká à proposta quaquilionária dos árabes do Manchester City já levantou a discussão sobre o confronto poder do dinheiro x amor à camisa. Kaká seria o último dos moicanos a recusar um caminhão de dinheiro para sair do time pelo qual é apaixonado (ou ainda - a dizer não a uma fortuna que representaria riqueza imediata, por conta de um plano de carreira pensado mais a longo prazo, de olho também na imagem que está construindo). 

Mas vamos, por um momento, trocar o foco da discussão - da resposta de Kaká para a proposta do Manchester City. É razoável que algo tão fora da realidade possa acontecer? É óbvio que, economicamente, o contrato que eles estavam propondo não fazia o menor sentido. É impossível que o retorno pagasse o investimento, por mais marketing que Kaká possa gerar, por mais títulos em campo que ele pudesse conquistar.

Muitas vezes, ao se falar sobre possíveis modelos para o futebol brasileiro, usamos como parâmetro a realidade européia. Mas a verdade é que o formato europeu permite esse tipo de coisa - gente aparecendo com dinheiro sabe-se lá de onde, inflacionando o mercado, deixando o negócio insustentável. Em entrevista no Arena Sportv, um tempo atrás, Leonardo - do alto de sua experiênica no Milan - afirmou com todas as letras: as contas lá não fecham. De modo geral, ou o clube não consegue destaque nas competições mais importantes ou precisa de alguém injetando dinheiro de fora. É o caso de Berlusconi, no Milan. Há exceções, mas não muitas.

Não é à toa que o Lyon, multi-campeão francês, não consegue transformar o domínio local em conquistas continentais. Na França, as finanças dos clubes têm muito mais limites; por lá, existe a DNCG (Direção Nacional de Controle de Gestão), que é responsável por fiscalizar riscos financeiros na administração dos clubes, analisar sua estrutura jurídica e a situação dos acionistas, fiscalizar prestações de contas, verificar seus orçamentos para temporadas futuras. Diversos times já sofreram punições deste órgão, como Bordeaux, Olympique de Marselha e Monaco. Se isso, por um lado, faz com que a liga francesa tenha uma vida econômica saudável, por outro faz com que seus times tenham dificuldades ao competir no mercado europeu, já que seus grandes concorrentes vivem em um ambiente totalmente desregulado.

A questão é que essa falta de regulamentação dos outros países faz com que o negócio basicamente não se sustente e vire um paraíso para "investidores" com dinheiro de origem duvidosa. Surge agora o dono do Fulham, o egípcio Mohamed Al-Fayed, reclamando da situação e pedindo providências das autoridades do futebol inglês - como a criação de um teto salarial.

Nos Estados Unidos, o teto para o gasto dos times com salários de atletas já existe há décadas. Na NBA, há um teto salarial por jogador e ainda um limite para os clubes, que só podem gastar até 55% de suas receitas com a folha salarial - uma espécie de "lei de responsabilidade fiscal". E, por lá, todo contrato de jogador é público - clique aqui para dar uma olhada nos valores mais altos e no quanto cada franquia gasta com seus elencos. A mesma política é adotada por todas as outras grandes ligas profissionais americanas, com algumas variações de esporte para esporte.

O modelo americano poderia servir de lição para o futebol nesta época de loucuras de misteriosos milionários russos e árabes cheios de petrodólares. Não só o europeu, mas mesmo o brasileiro. Já assistimos por aqui os estragos no equilíbrio do negócio (e em sua lisura...) que são causados quando alguém vem de fora para inflacionar o mercado - como nos casos de ISL, Nations Bank, MSI e por aí vai. Algo assim serviria não só para garantir a saúde financeira dos clubes, mas também para estimular o equilíbrio e a alternância de força nas competições - algo que os americanos aprenderam há muito tempo ser fundamental pra garantir o futuro de seu negócio.

Nenhum comentário: